terça-feira

Trechos de "Uma vida inventada"


MEMÓRIAS TROCADAS E OUTRAS HISTÓRIAS de Maitê Proença

" Não sou certinha, não sou calma, não penso uma coisa só, o sangue me corre quente, sou da briga e quero brincar, dou risada alto, falo baixo, tenho explosões de alegria e fico muito, muito triste. Mas não me faço de coitadinha e não choro à toa ou por falta de coragem."

" Só eu sei onde vou cavar minhas lágrimas e no que preciso chafurdar para que elas venham verdadeiras. Passei anos trancada num lugar sem sentimentos que inventei para sobreviver."

" Como o mar não estava pra peixe, resolvi submergir para águas profundas onde ninguém me veria rearrumar o caos que se instalara por dentro e por fora de tudo - e por ali fui levando enquanto a vida seguia como dava. Então,..., um belo dia me peguei comovida com algo banal, e depois com um fato nada dramático, e em seguida com a desventura de um amigo, percebi que alguma coisa mudava sensivelmente dentro de mim, algo se abria e me aliviava."

" Deve ser por isso que hoje a medida das coisas muitas vezes me escapa. Quando a gente perde a delicadeza de se deixar mobilizar pelo entorno e recupera isso depois, o valor dos sentimentos se eleva."

" Nesse mundo não há saída: há os que assistem, entediados, ao tempo passar da janela, e há os afoitos, que agarram a vida pelos colarinhos. Carimbada de hematomas, reconheço, sou do segundo time."

" Na história de minha família errou-se muito por não se medir a consequência dos atos. Grandes sofrimentos surtiram por não sabermos conter ímpetos vorazes. Posso afirmar, entretanto, que vivi cercada de uma gente de verdade, interessada em sorver a essencia das coisas - na minha família pulsa a integridade até na gota do sangue vertido com a morte, é uma questão de temperamento."

" A gente gasta um tempo danado seduzindo os outros. É uma espécie de vício que se aprende quando criança e que vamos sofisticando ao longo da vida. Verdade que nem sempre resulta em sexo, e muitas vezes nem é por ele que seduzimos, mas para sermos apreciados no que quer que seja."

" Não entergaria minha vida a outro de caso pensado, sou defendida e controladora demais. É da natureza dos que foram abandonados. Qualquer menino de rua é metido a mandão, com a diferença de que tem o discernimento endurecido pela cola de sapateiro, enquanto eu mantenho sempre os sentidos atentos para não permitir que alguém venha assaltar minhas fragilidades."

" Só tem graça o que mexe nas minhas profundezas, ou então que fique tudo quieto e calmo."

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