sexta-feira

Liberdade, de Jonathan Franzen (Companhia das Letras)


Chega ao fim meu casamento com o livro de Jonathan Franzen, que segundo o The Guardian é o livro do século. Minha história com ele começou quando estava na minha característica garimpada de livros na livraria da vila, onde mais recentemente tenho ido ler todas as orelhas antes de decidir qual levo para casa, quando uma moça muito simpática que lá trabalha me perguntou se queria alguma indicação. Claro, sempre quero muitas dicas de coisas que me interessam! E aí ela me trouxe Liberdade. E quando eu estava indo embora, antes de me despedir ela me avisou - vai ficando cada vez melhor conforme você vai lendo.
E realmente vai. Não é um livro leve, apesar da linguagem coloquial, é um retrato nu e cru da sociedade norte-americana, e por consequencia nossa, já que absorvemos muito do que é americano. Mas o livro vai além, fala de sentimentos demasiadamente humanos, possíveis em qualquer família, em qualquer pessoa que não está apenas cumprindo cegamente um papel no mundo. 
A base é um triângulo amoroso que nasce nos anos 70 quando todos eram jovens demais e se desenvolve por uma vida inteira de personagens construídos com fantástica perspicácia e profundo perfil psicológico. Durante a leitura você ri, se angustia, se revolta, fecha o livro para tomar um banho e pensar sobre o assunto. Adolescentes crescem, namoram, saem de casa, casam, têm filhos, esses filhos crescem, saem de casa, namoram, casam e seus pais se perguntam se fizeram certo. Seus pais se questionam o que fizeram da vida. Seus pais se perguntam sem amaram as pessoas certas, se ainda dá tempo.
Como disse antes, esse é o pano de fundo pra questionar o verdadeiro sentido e valor da liberdade. Quando ela começa a ser nociva e como pode gerar a misantropia quando é desejada de maneira utópica e irracional, seja no seio da família, seja nas nossas próprias visões político-sociais.
Apesar de achar que "o livro do século" é uma hipérbole marqueteira do jornal do Reino Unido para atiçar os leitores, posso facilmente considerar Liberdade a melhor leitura dos últimos tempos.


Excelente análise do livro dá uma idéia melhor sobre o porque Jonathan Franzen é considerado um estilista na arte de escrever.


Trechos da obra...

"Àquela altura, ela acreditava que era por ser desprendida e ter espírito de equipe que os elogios pessoais diretos a deixavam tão encabulada. A autobiógrafa hoje acha que os elogios eram como uma bebida de que ela inconscientemente tinha a prudência de evitar uma gota que fosse, visto que sofria de uma sede infinita."

"Alguma coisa está errada comigo. Adoro todas as minhas outras amigas, mas sinto sempre que existe um muro entre mim e elas. Como se todas fossem um tipo de pessoa e eu fosse outro. Mais competitiva e egoísta. No fim das contas, menos boa. De algum modo eu sempre acabo me sentindo como se estivesse fingindo quando estou com elas. Com Eliza não preciso fingir nada. Posso ser simplesmente eu mesma e ainda assim ser melhor do que ela. Eu sei que ela é uma pessoa bem doida. Mas uma parte minha adora estar com ela."

"Ela começou a chorar por Walter. Tinham passado tão poucas noites separados em todos aqueles anos que ela nunca tinha a oportunidade de sentir saudades dele e gostar dele de longe da maneira como sentiu saudades e gostava dele de longe agora. Era o começo de uma confusão terrível no coração dela(...). E já àquela altura, às margens do Lago Sem Nome, (...), ela viu o problema com toda clareza. Tinha se apaixonado pelo único homem no mundo que gostava de Walter e queria protegê-lo, tanto quanto ela."

"Uma semana antes do dia marcado, ela retornou para o lago sozinha e se entregou inteiramente à sua perturbação mental, o que consistia em embriagar-se até cair toda noite, acordando mais tarde em pânico, tomada pelo remorso e pela indecisão, e depois dormindo até de manhã, e lendo romances num estado suspenso de falsa tranquilidade, depois se levantando de um salto e andando por uma hora ou mais de um lado para o outro nas proximidades do telefone, tentando decidir se ligava para Richard e lhe dizia que não viesse, e por fim abrindo uma garrafa para afastar-se daquilo tudo por algumas horas."

"O que ela devia ter feito àquela altura era procurar um emprego, retomar os estudos ou ir trabalhar como voluntária. Mas sempre parecia haver alguma coisa atrapalhando. Havia a possibilidade de que Joey se arrependesse e resolvesse voltar para casa durante o último ano da escola. Havia a casa e o jardim de que ela não cuidara durante todo seu ano de bebedeira e depressão. Havia a liberdade que valorizava tanto, de poder passar semanas a fio no lago Sem Nome sempre que lhe dava vontade. Havia uma liberdade mais geral que ela percebia que lhe fazia mal mas de que mesmo assim ela não conseguia abrir mão."

"E então ela começou a chorar torrencialmente, e ele se deitou ao lado dela. As brigas tinham se transformado no portal dos dois para o sexo, e eram quase a única maneira como o sexo ainda acontecia. Enquanto a chuva açoitava o céu e relampejava, ele tentava deixá-la cheia de amor próprio e desejo, tentava transmitir-lhe o quanto ele precisava que ela continuasse a ser a pessoa em que ele pudesse enterrar seu afeto. Nunca funcionava muito, mas ainda assim, quando acabavam, vinham alguns minutos em que ficavam deitados nos braços um do outro na majestade tranquila de seu duradouro casamento, abandonando-se na tristeza compartilhada e no perdão por tudo que tinham infligido um ao outro, e conseguiam descansar."

"A personalidade suscetível ao sonho de liberdade ilimitada é uma personalidade que também tende , quando o sonho desanda, à misantropia e à ira."
Essa frase especialmente é citada pelo autor quando ele está contando a história do avô de Walter, um imigrante sueco, que foi para os Estados Unidos em busca do seu sonho de liberdade e dá errado. É um dos momentos significativos no processo do autor de analisar o sentido e significado da liberdade.

"Lalitha, por sua vez, já estava muito ocupada selecionando centenas de novos candidatos a estagiários(...). O compromisso dela com o combate à superpopulação era tão prático e humanitário quanto o de Walter era abstrato e misantrópico, e uma medida do aprofundamento do amor que ele sentia por ela era o quanto a invejava e desejava ficar mais parecido com ela.

"Como uma nascente gelada no fundo de um lago de água mais quente, a antiga depressão devida aos genes suecos brotava por dentro de Walter: a sensação de que não merecia uma parceira como Lalitha, de não ter sido feito para uma vida de liberdade e heroísmo fora da lei; de precisar de uma situação contrária mais tediosa e persistente de insatisfação para nela forjar sua existência. E via que simplesmente cultivando esses sentimentos ele começava a criar uma nova situação de discórdia com Lalitha. E era melhor, pensou ele depressivamente, que ela ficasse sabendo desde logo como ele era na verdade."

"Dedicando tanto tempo a ouvir seu pai zombar de tudo embora a cada dia em voz mais fraca, ficou perturbada ao ver o quanto se parecia com ele, entendendo porque seus filhos não achavam tanta graça em seu senso de humor, e por que teria sido melhor ter se forçado a ver mais seus pais nos anos críticos de sua própria maternidade, a fim de entender melhor a maneira como seus filhos reagiam a ela. Seu sonho de criar uma vida nova, totalmente a partir do zero, independente de cabo a rabo, não passava de fato disto: um sonho."











terça-feira

Sonhos Roubados, de Sandra Werneck



O filme de Sandra Werneck, Sonhos Roubados, me fez refletir sobre a vida muitas vezes sem perspectiva de algumas garotas com poucas oportunidades na vida. São três garotas que sofrem pela vida desregrada, pela falta da orientação, pela falta de pais. Chegam no fundo do poço, cada uma na sua história e se deparam com a solidão presente na alma de quem se esgota, de quem chega ao próprio limite.
É um filme triste, vidas difíceis, mas tem esperança. Se você chega até o final ele não te faz ir dormir descrente da força interior que pode brotar do ser humano em momentos trágicos da vida. No fundo é uma história de superação e escolhas. O que podemos fazer quando vemos que precisamos definitivamente mudar a vida que vivemos? Temos escolhas?

quinta-feira

Cópia Fiel, 2010 (Copie Conforme, de Abbas Kiarostami)


Cópia Fiel quase passou sem que eu conseguisse ir assistir. Simplesmente adooro Juliette Binoche. A linda, suave e excelente atriz de Blue Velvet está incrível. Ela atua de maneira tão natural que chega a ser muita areia para um filme de qualquer diretor. Digo isso porque se o texto é fraco, se o roteiro nao tem nuances, detalhes, nao precisa de uma atriz como Juliette. Ela diz muito com apenas um olhar, uma expressão...Binoche já ultrapassou a técnica, a arte de atuar já faz parte dela.
O filme de Abbas Kiarostami é o complexo paralelo entre a análise de um crítico de arte do significado do original e da cópia de qualquer obra de arte - relativizando o que é ser original, nos obrigando a ver que a cópia fiel pode acabar se tronando original - e a relação entre um homem e uma mulher - onde você acaba se perdendo no decorrer do filme se aquele casal é de fato um casal ou estão interpretando a cópia fiel de um casal que está em crise.
Uma determinada cena me fez lembrar um plano da sequência do sonho de Morangos Silvestres de Ingmar Bergman, quando uma câmera chapada e estática descansa num paredão e o ator caminha no plano. Talvez Kiarostami tenha bebido da fértil e poderosa fonte do diretor sueco.
Com diálogos densos, extensos e profundos é um filme para ver e rever algumas vezes; daqueles filmes que sempre vão nos presentear com algum novo argumento, algum novo insight.


quarta-feira

Meia Noite em Paris, 2011 (Midnight in Paris, de Woddy Allen)


Quando Woody Allen quer falar sobre uma cidade ele realmente fala sobre a cidade. Meia noite em Paris começa com cantinhos da cidade luz que só um produtor de locação fora de série consegue localizar. Juntando com os ângulos e câmera de Allen, que são precisos e sem frescura, somos transportados para dentro de Paris com o olhar de um morador, com cantinhos típicos de quem parou para observar, de quem caminhou pela cidade a pé. Somado ao jazz no fundo, não precisava de nenhum letreiro para dizer que mais um filme do grande cineasta estava na telona.
Fui pro cinema sem ter idéia do roteiro. Raramente faço isso porque vasculho demais antes de deicidir o filme do dia, mas em se tratando de Woody Allen quis não saber do que se tratava.
Começa o filme, quando Gil (Owen Wilson) entra no cabaré e se depara com Zelda Fitzgerald soube que teria momentos de muita diversão durante os 60 minutos seguintes. Depois das risadas angustiadas de Vicky Cristina Barcelona fazia dois anos que não me esbaldava com um filme seu que fosse realmente hilário.
Tirando o fato que Allen é um cineasta que fica cada vez melhor conforme os anos vão passando, em Meia Noite ele usa toda aquela alegoria para tratar de um assunto tão familiar para os seres verdadeiramente nostálgicos. A insatisfação com a época que vivemos é um assunto clássico entre muitas rodas de amigos. Não vou dizer cem por cento mas grande parte das pessoas interessantes que tenho o prazer de ter do lado pelo menos alguma vez me disse que gostaria de ter vivido em alguma outra época que não a nossa. Faz parte do mistério glamuroso de se ver vivendo numa época mais romântica, ou mais intelectualizada ou mais rebelde que vaga no nosso coração. E os menos sonhadores sempre nos contam o que tinha de ruim na época e que hoje é completamente transformado. Aquela velha história - ah, os anos 70 deviam ter sido incríveis, com a contra cultura gritando alto, época de música engajada latente no Rio de Janeiro. Daí alguém logo vira para você e diz - você queria viver sem liberdade de expressão, em plena ditadura?
É assim, o mundo está mais ou menos dividido entre os sonhadores e os que catapultam nosso delírio e tentam nos trazer pra a realidade nua e crua.
Por isso amei tanto esse filme. O personagem é tão nostálgico que vive um absurdo! Eu sinceramente ia amar acordar no meio de Sartre, Beauvoir sua turma bem no início do existencialismo, naqueles cafés em Paris nos anos 20. Sim exatamente nessa época porque depois eles ficam chatos e politizados demais e aí eu preferiria pegar um carro antigo à meia noite e ir encontrar Cole Porter em algum lugar bem boêmio da época.
Vale deixar registrado que gostei muito da atuação do Owen Wilson, fazendo aquele ar meio neurótico dos personagens de Woody Allen, onde a gente sempre consegue enxergar o cineasta atuando, no jeito de andar, nas expressões e nos diálogos cheios de riqueza, escritos por quem o intelecto está num status acima da média.

terça-feira

Quando o planeta será orgânico?



 Essa é uma pergunta que sempre me faço. Realmente gostaria que a mesa do brasileiro fosse mais farta de produtos orgânicos. Mas sei também que uma grande objeção é o preço. Sim, eles são bem mais caros. Precisaria que todos apostassem de uma hora para outra nesses produtos e assim aumentaria a procura e os preços ficariam mais competitivos. Oferta temos, porque o Brasil é o segundo maior produtor de orgânicos do mundo, exportando grande parte da produção. Enquanto isso ficamos comprando produtos cheio de pesticidas, fertilizantes sintéticos e hormônios na sua produção e correndo riscos a médio e longo prazo. Sim, os riscos são desde imunidade baixa e gripes constantes até câncer.
Os alimentos livres de agrotóxicos são mais saborosos, menos inchados de água e mais ricos em nutrientes, além disso é amigo do planeta. Claro, quando contaminamos a terra no plantio irresponsável, contaminamos também nossos rios e os lençóis freáticos. Os animais livres que deveriam estar polinizando e "se alimentando"das pragas naturais da agricultura fugiram para não morrer. Essas pragas são combatidas com antibióticos e mais produtos químicos, gerando o ciclo vicioso que vai acabar dentro do nosso organismo. A terra que se cultiva orgânicos é uma terra pura, que fica aproximadamente dois anos livre de um determinado cultivo para se renovar naturalmente, dando lugar a rotação de culturas. Sim, a terra pode se renovar por conta própria, com os adubos naturais e trazer pra gente a sensação deliciosa que é comer a fruta da estação. Pra que adianta encontrar tantos melões sem gosto no super mercado durante o ano inteiro?
Os animais que vivem nesse solo saudável e fértil são animais que produzem alimentos livres de toda essa química e portanto mais saudáveis também!
Acho que não tem preço podermos oferecer aos nossos filhos desde cedo alimentos com mais sabor, poder comer a casca de uma cenoura sem medo, colocar dentro do nosso corpo coisas puras, que só irão fazer o bem.

Aqui, um artigo sobre orgânicos do site Crianças na Cozinha, com uma lista de todos os produtores orgânicos do Brasil.

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