quarta-feira

Thérèse Desqueyroux, 2013 de Claude Miller




Thérèse D. é a adaptação do clássico Thérèse Desqueyroux (no Brasil suprimiram o sobrenome) de François Mauriac, publicado no início do século XX. Mais uma heroína do estilo Flaubert, Thérèse sofre com uma tormenta particular - sua constante enxurrada de pensamentos incontroláveis. Dona de uma mente ativa, criativa e profunda, acredita que pode ser salva pelo casamento. De alguma forma buscou na relação com Bernard uma trégua para todas as idéias que não lhe saíam da cabeça. Faz convicta o que é esperado de toda e qualquer mulher da época, se casa com o bom partido escolhido pelas famílias, achando, sinceramente, que encontraria um sentido para tudo.
Só que pensamentos não encontram consolo no casamento. E muitas vezes em lugar nenhum. Pelo contrário, quanto mais ela vivia, menos sentido encontrava para a vida que tinha. Vendo o marido feliz, realizado com o que julgava pouco, fervia por dentro.
Quando saí do cinema, ouvi alguém comentar, deus me livre um casamento daquele! Pulei. Aquela mulher não tinha entendido a moral da história! O casamento era bom, Thérèse era casada com um homem atencioso, devotado, era uma mulher rica, com empregados que ajudavam, tinha a família por perto. O problema dela não era o marido. O problema era ela! Que simplesmente não cabia ali. E esse é o verdadeiro e triste drama da personagem. Essa inadequação que a fez aumentar as doses do arsênico, tentando de algum modo tumultuar aquele marido, fazer com que alguma inquietação brotasse daquele ser tão complacente.
Depois me fez lembrar da coluna recente do Contardo Calligaris, na Folha de SP, refletindo sobre como não adianta o casamento com um homem provedor, fiel, gentil e insosso para aquietar o coração das mulheres. 'Elas têm sonhos e desejos que vão além de um marido devoto, de uma família e de uma vida ao abrigo das necessidades. E os homens descobriram que não fazem suas companheiras tão felizes quanto imaginam ter feito a felicidade de suas mães. A descoberta do desejo feminino acompanha a descoberta da inadequação e da insuficiência dos homens como marido e também como filhos'.
Thérèse com todo seu espírito de liberdade, ironicamente constrói a sua prisão. E é tão emocionante ver a generosidade daquele marido, que mesmo sem conseguir acessar aquela mulher que já se tornara tão estranha, lhe entrega de volta a vida.
De todo modo, não basta ter uma cabeça aberta se estivermos entre pessoas que não conseguem compreendê-la. Quanto mais distantes estivermos do nosso entorno, mais escura é a nossa prisão.




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